quinze de agosto

joão
2 min readAug 15, 2023

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Quinze de agosto de dois mil e vinte três.

Luzes. São elas, sempre presentes, mesmo que agora sejam contempladas por uma insuficiência de intensidade e presença clara e marcada. Luzes, que dançam pela pele fraca, encharcada de lágrimas, um rosto danificado e marcado por tipos inusitados: cicatrizes, espinhas — espremidas ou não, ao ponto de explodir. Sem qualquer sorriso, e se fizesse presente, mostraria seus dentes amarelados, fruto dos mais baratos cigarros e cafés mal passados de seus grãos carbonizados, restando apenas o gosto de queimado na língua. Memórias que se perdem na linha incalculável do tempo de percepção difusa, distorcida conforme este o contempla. Carente de carinho, o conforto que sempre o lembrou de sua existência turbulenta neste cosmos infernal que se encontra. O que resta é pouco, menos do que o suficiente para se considerar um ser vivo.

Acha-se, então, uma forma de lidar e cobrir, tanto pela sofreguidão quanto pela admiração externa: seu olhar, sempre posto sobre estes pequenos e particulares cosmos que transitam pelo plano terrestre, buscando dispensar a crescente necessidade de alarvaria. O observar é pelo carinho e respeito, sempre em constante contraste com a inveja. O desejo, desguarnecido de lascívia, potencializado pela nostalgia do que algum dia fora o amor, nunca consumado no toque, tornando-se uma reminiscência preenchida pela ausência. O espírito se torna uma assombração, um espectro tomado pelo ressentimento, pelo o que não foi feito, enclausurado pela tormenta.

Mundos, em suas próprias regras e gravidade — corpos que se atraem, por um breve momento, sempre conscientes de seu fim. Inevitável, percebido no toque suave de dedos apaixonados em uma pele ansiosa por carinho, por ternura. A fala pode existir, a dúvida de permanência de sensações se dissipa com o olhar. Tolo é aquele(a) que não se permite de amar, de concretizar e dissipar quaisquer ambiguidades e incertezas da vida.

Mantenha vivo este sentimento que o dispõe de acordar. Essa força motora, tão ausente na sociedade contemporânea, que dissipa a moral que calcula suas palavras, que fazem delas naturalmente desleixadas. A flexão suave do corpo, um vislumbre do que já passou — tão doce, tão viciante contemplar aquilo que faz sua pupila dilatar, o coração acelerar, a mente inebriar. Noites mal dormidas, conflitantes em suas naturezas destrutivas: o corpo lentamente definha, a mente grada a aflorar o que ameniza, lhe dá certa esperança do que antes era incerto. Que seja mutável, que seja indefinido, que seja finito; o que lhe faz respirar é a incerteza do que lhe espera ao acordar, mesmo que esteja amedrontado pelo perigo, pelo desconforto que é a dor do abandono e da desatenção (afinal, não somos filhos deste infortúnio?).

Pouco entendo sobre o amor. E acho que prefiro o entender cada vez menos.

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joão

Tous ceux quit manquent se réfugient dans la réalité